Antes de eu ir embora, a senhora poderia deixar eu só jantar? Meu corpo está muito fraco, eu não dormi nada essa noite, eu vou ter que pegar ônibus para ir embora”.
Esse foi o pedido de um homem de 20 anos ao conseguir o alvará de soltura em Santa Luzia, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, no último fim de semana.
Ele ficou um dia preso suspeito de roubar o celular de uma mulher, de 22 anos, usando uma faca. O pedido inusitado foi realizado durante uma audiência de custódia. O promotor Luciano Sotero Santiago, que estava de plantão, divulgou o caso no Twitter.
Conforme o boletim de ocorrência da Polícia Militar, a vítima contou que passava pelo bairro Boa Esperança, na noite da última sexta-feira (3), quando o suspeito pediu que ela passasse o aparelho telefônico.
Em seguida, ele fugiu, mas foi localizado por militares.
“Eu era o promotor plantonista, chegou na manhã de sábado e encaminhei para a juíza o pedido de liberação dele. Geralmente, o pedido de prisão é com argumentos genéricos: a sociedade está em risco, a gravidade do crime. Mas a Constituição não admite antecipação de pena. Para ter culpa formada é preciso ter um processo para ter defesa”, explicou o promotor em conversa com o g1 Minas nesta quarta-feira (8).
Segundo ele, o jovem confessou do crime, o telefone foi devolvido e o rapaz é réu primário.
Sendo assim, outras medidas cautelares foram impostas: proibição de contato e aproximação da vítima, monitoramento eletrônico e comparecimento à Justiça uma vez por mês.
“A audiência de custódia foi realizada no domingo com a minha participação, da juíza e de uma defensora pública. Ficou claro que ele apresentava algum transtorno e foi solicitada avaliação psicológica e psiquiatra. Ele disse que ouvia vozes, tinha dificuldade para dormir e de acesso à medicação. Ele não tem linguajar e postura de gente voltada para a prática do crime, não era roubo para manutenção de vício com droga”, detalhou Santiago.
Jovem tinha fome
Segundo o promotor, o pedido do suspeito por comida o deixou consternado e o post no Twitter foi uma forma de desabafo.
“Esse caso retrata a criminalização da miséria, da pobreza. A gente não sabe se ele tinha discernimento do que estava fazendo. Não gerou impunidade, ele vai ser processado e, se comprovado a culpa, ele será condenado”, afirmou.
Ainda conforme o promotor, o desabafo na rede social não gerou tantos comentários com discurso de ódio, mas discurso de compreensão.
“Ele abriu mão da liberdade para ter comida, disse que fazia ‘bico’ de pedreiro. Ele não tinha antecedentes, não posso presumir que ele vai cometer mais crimes. A prisão não recupera ninguém, se coloco mais um lá é um risco dele sair formado na faculdade do crime”, finalizou.
Por meio de nota, a Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública de Minas Gerais (Sejusp) informou que o homem deixou o sistema prisional no domingo (5).
Portal Guaíra com informações do G1