Seis anos após dar à luz a uma menina no Hospital Regional de Planaltina, no Distrito Federal, a dona de casa Geruza Ferreira descobriu que a criança que levou para casa não é sua filha biológica. Um exame de DNA provou que não há relação de sangue entre a mulher e a menina, e a mãe acredita que houve troca de bebês na maternidade.
“Foi um crime o que fizeram, comigo e com a outra família. A menor que está comigo eu sei que está sendo bem cuidada, tem amor. E a outra? Onde e como está? Como está sendo tratada? Ás vezes, eu nem durmo a noite, pensando”, diz Geruza.
O governo do DF nega que tenha havido troca de bebês no hospital. No entanto, em agosto desde ano, a Justiça do DF entendeu que a substituição ficou comprovada e determinou o pagamento de indenização de R$ 300 mil por danos morais. O processo corre em segredo de Justiça.
Questionada pela reportagem, a Procuradoria-Geral do DF, que representa o governo em processos judiciais, disse que já recorreu da decisão. Já a Secretaria de Saúde informou que não foi notificada oficialmente do processo (veja mais abaixo).
Descoberta
A menina foi fruto de uma relação que Geruza teve com um homem, entre 2010 e 2013. No fim da gestação, eles terminaram. A menina nasceu em 14 de maio de 2014, no Hospital Regional de Planaltina. E a mulher acredita que a filha foi trocada na unidade de saúde.
“Por volta das 5h, eu tive a bebê. Eles levaram, deram banho, trouxeram e me deram. Quando eu cheguei em casa, os vizinhos, por eu ser mais clara e o pai dela também ser claro, sempre falavam: ‘Essa menina é muito escura’. Mas na minha família tem todas as cores, aí eu nunca dei importância para isso”, diz.
O ex-companheiro registrou a criança e ajudou financeiramente nos primeiros anos, mas não manteve contato próximo com ela. Em 2020, a mãe foi surpreendida com um processo, movido pelo homem, no qual pedia a exclusão do nome dele do registro da criança. O motivo: o pai havia feito um exame de DNA, que comprovou que a menina não era filha dele.
Consternada com a situação, Geruza decidiu fazer um exame de DNA para comparar o próprio sangue e o da criança. O resultado chocou a mulher. Não havia possibilidade de a menina ser filha biológica dela.
Ação na Justiça
Após a descoberta, Geruza foi à Justiça pedir o pagamento de indenização pelo governo do DF, devido aos danos causados pela situação. Em defesa, o governo disse que a mulher não apresentou provas de que houve negligência na atuação dos servidores do hospital.
Segundo o Executivo local, “foram adotados todos os procedimentos adequados para o nascimento da filha da autora, não havendo nenhum elemento que permita aferir a veracidade das alegações da autora quanto à possível troca dos bebês na maternidade”.
No entanto, ao analisar o caso, o juiz Alessandro Marchio Bezerra Gerais entendeu que ficou comprovada a troca das crianças.
“Como não é razoável presumir que a troca tenha ocorrido em momento posterior à alta da autora da maternidade sem que ela percebesse (até porque, com o tempo, as feições do bebê vão se definindo), reputo devidamente comprovado que a sua filha biológica foi trocada quando do seu nascimento no estabelecimento hospitalar supra apontado”, diz na decisão.
Ainda de acordo com o magistrado, “não é difícil imaginar o estado de permanente angústia e ansiedade pela qual passa a autora desde que o fato veio à tona”.
“Em uma situação como esta, em que não se sabe sequer se o filho biológico está vivo, e caso esteja, se está sendo criado e educado em condições dignas, cria-se uma série de incertezas que a autora eventualmente poderá carregar para o resto de sua vida, causando sérios prejuízos inclusive para a sua forma de se relacionar e interagir com as pessoas mais próximas.”
Investigação
Além da ação na Justiça, a família também registrou um boletim de ocorrência na Polícia Civil. O caso está sendo investigado há um ano pela 16ª Delegacia de Polícia, em Planaltina. Segundo o delegado, todos os envolvidos já foram ouvidos.
Na semana passada, Geruza foi intimada a fazer um novo teste de DNA. Desta vez, o exame será realizado no Instituto de Pesquisa de DNA Forense da Polícia Civil.
A mãe afirma que a filha já sabe da situação. “Ela é muito inteligente. Ela percebeu e eu mesmo contei, mesmo sem ajuda de um psicólogo. Não tinha mais como esconder dela”, conta Geruza.
“Afetou a família inteira. Com esse problema, esse erro do hospital. E eu queria contar para não ocorrer com outras famílias. Para ninguém passar pelo que eu estou passando por que é muito dolorido. Você fazer várias perguntas e não ter nenhuma resposta”, diz.
O que diz o GDF
Confira o posicionamento da Procuradoria-Geral do DF sobre o caso:
“A Procuradoria-Geral do Distrito Federal (PGDF) informa que já recorreu da Decisão.”
Confira o posicionamento da Secretaria de Saúde do DF sobre o caso:
“A Secretaria de Saúde informa que ainda não foi notificada oficialmente sobre o processo.
É importante ressaltar que esses casos correm em segredo de justiça, e sempre que notificada, a pasta fornece todas as informações necessárias às autoridades judiciais.
Por fim, a secretaria destaca que está à disposição da justiça para os devidos esclarecimentos.”
Portal Guaíra com informações do G1